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http://jazzística.blogs.sapo.pt

Blog de poesia , música e olhares de Marina Malheiro, aprendiz de poesia

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“desafio de escrita dos pássaros #3”

27.09.19 | marina malheiro

Um momento marcante

A vida é como uma corrida de 42 km: temos de passar por dores, alegrias, sucessos e termos resiliência q.b. para atingirmos uma meta de pacificação na velhice.

Portanto, o “confesso que vivi” de Neruda é o legado que pretendo deixar aos meus filhos.

Dos vários momentos marcantes pelos quais passei e que me ensinaram a crescer, a relativizar mais as trivialidades diárias, destaco um (de entre tantos documentados neste Blog, desde 2010) relacionado com a minha vida de ensino, a dos meus alunos da Damaia.

Vindos de Cabo-Verde e  de São Tomé, ali estavam diante de mim aqueles miúdos que tinham vindo para Portugal para jogar futebol, talvez um dia no Benfica. Treinavam todos os dias no Damaiense, mas muitas vezes não tinham dinheiro para comer no cartão da escola e outras nem tinham um par de ténis para calçar. Soube por um deles que uma funcionária da escola que lhes achava piada lhes dera uns ténis que tinham ficado abandonados, sem reclamação de ninguém, no pavilhão desportivo. Tão gastos os ténis. Lembro-me do contentamento de um dos miúdos, como se fossem uns ténis acabados de comprar na loja.

Foi com eles que aprendi algumas palavras em crioulo de Cabo Verde e aprendi- alguns alunos também nos dão ensinamentos- o significado mais puro da palavra bondade. Um dia, já no final do ano letivo, resolvi combinar um lanche com eles e com o meu filho mais velho- na altura teria oito anos- para que ele soubesse o que era uma escola pública, sem grandes meios, mas com excelentes recursos humanos. Assim foi. Na tarde combinada lá estavam eles, vestidos com o melhor fato de treino que tinham, trazendo gomas para o meu filho e ele bolos e sumos para eles. Perguntei por um deles, que era o miúdo mais desportista de todos – eu vou para o Benfica, a stora vai ver! - respondem-me: stora, ele teve vergonha porque não tinha dinheiro para comprar doces para o seu filho, como nós todos tínhamos combinado.

Aos meus alunos da Damaia, agora uns jovens de vinte anos, que estarão, talvez, nalgum clube de futebol, atrás do sonho deles. À grande professora Albertina.

Música- Tito Paris ( Dança Ma Mi Criola), ao vivo em Lisboa, 1999 ( todos os direitos reservados a Tito Paris)

@mmalheiro

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